sexta-feira, 1 de maio de 2009

The filth and the fury. Um tiro certeiro numa Inglaterra conservadora


Não pretendemos aqui apontar as qualidades técnicas, que de resto abundam, na montagem deste documentário. Interessa-nos dissecar ao osso e chegar a uma conclusão sobre as causas que levaram ao nascimento e o seu impacto social em Inglaterra do movimento Punk.

Para tal efeito, o melhor será beber da fonte, e ouvir da boca dos próprios Sex Pistols, banda que se não lhe deu origem, certamente liderou as massas juvenis no seio desse movimento. Discussões à parte sobre a origem da banda no que concerne ao comercialismo barato de Malcom McLaren, a realidade é que Johnny Rotten, vocalista e principal interlocutor do documentário em questão, nos dá a entender que no meio duma geração que parece perdida e sem rumo, esconde-se, não um pensamento per se, mas uma maneira de encarar a realidade social de uma forma peculiar e jamais gratuita, como muitos afirmam.

As primeiras imagens de" The Filth and The Fury" revelam-nos uma Inglaterra descontente perante as falsas promessas do Partido Conservador. Questões que se arrastavam desde o pós-guerra haviam atingido proporções desumanas, sendo que a classe operária, o tecido base de qualquer sociedade moderna, se corroía graças a posição económica que haviam sido forçados a aceitar.

As condições precárias de trabalho bem como os salários minúsculos que eram atribuídos, geraram uma panóplia diversa de problemas, podendo-se destacar o aumento significativo de confrontos e preconceito racial, constantes desacatos com as forças da autoridade, que para uma classe oprimida representam as ferramentas de repressão do estado, até a uma degradação na qualidade de informação mediática que mantinha convenientemente a população num estado de ignorância sobre os assuntos do pais e sobre as propostas governamentais para solucionar os mesmos. Quando Rotten diz que o povo estava assustado tem razões para o afirmar.

Para terminar este panorama social é necessário referir uma greve gigantesca por parte dos lixeiros municipais, que pararam de trabalhar quase 3 anos exigindo melhores condições de trabalho e um salário justo. A consequência desta greve é que a capital Inglesa fica submersa em lixo. O panorama visual não era agradável, e certamente não seria propicio a uma mente saudável.

Não obstante, uma grande parte da população juvenil preferia, segundo Johnny Rotten, esconder-se nas memorias de um passado mais agradável e que certamente não era seu, vestindo roupas que se enquadravam mais num contexto do movimento “flower power” do que propriamente na selva de cimento cinzento colorida por sacos negros imundos que se extendiam na cidade . No meio deste paradoxo visual, é natural que nasça algo como os Sex Pistols. É racional conceber que a revolta inconformista juvenil desse origem ao que apelidamos de Punk.

A musica é agressiva, reduzida á sua simplicidade de construção, mas é mesmo esse o seu propósito. Musica honesta, feita por quem se sente enganado, musica que recusa o pretenciosismo técnico e cujo o objectivo não é a exploração virtuosa nem a composição sem falhas. O seu âmago é expressão crua.

E dentro destes parâmetros o que se seguiu no que concerne ao visual e á atitude atribuída ao movimento punk, é duma simplicidade atrós. Não há dinheiro remendo as minhas calças com um alfinete de ama. O líder dos Sex Pistols afirma mesmo que a individualidade era o que contava. A utilização dos meios possíveis para se poder sobressair numa multidão, e deixar de ser mais um cidadão anónimo sem voz perante a situação vivida.

Não se trata de uma revolta assumida contra qualquer força governamental, mas sim um desligar consciente duma sociedade que se ignorava dentro de si mesma e no meio da crise se afundava no próprio desespero. A raiz do Punk não reside em mohawks, correntes e piercings de ama trespassando o nariz. Nasce com o objectivo de não representar mais do que a simplicidade de ser. Livre e individual. Claro que há um certo carácter romântico atribuído quando se coloca as premissas desta forma, mas é completamente plausível que no meio do caos social, a juventude londrina recuse essa mesma sociedade.

As consequências dessa movimentação juvenil no seu meio são claras. O individualismo e as ideias anti-sistema sobressaem no meio da conformidade geral, e a medida que o Punk ganhou adeptos e força, a comunicação social adquiriu um especial interesse nesta movimentação. Como consequência, o governo vê-se forçado a olhar para as suas medidas dum prisma diferente, de forma a prevenir que os jovens seguissem nessa direcção. Não queremos com isto afirmar que o movimento Punk tenha conseguido por si só corrigir a situação politica, mas quanto mais não seja, tornou visível aquilo que outrora escapava ao olhar resignado.

A mediatização do movimento, acabou por, inevitavelmente ser a sua morte. Com o aumento de cobertura mediática, as editoras acabaram por tomar interesse nesse novo estilo, o Punk Rock, e consequentemente começaram a surgir bandas novas por pessoas que não partilhavam os mesmos ideais(ou a falta deles) que caracterizaram inicialmente o movimento, e as próprias fileiras engrossaram com as populares cristas multicolor. A individualidade transformada em uniforme, o Anti-Sistema agora absorvido por aquilo que pretendia se desprender.

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