quinta-feira, 28 de maio de 2009

Uma Historia revestida de cabedal.



Metal: A Headbanger’s Journey, o filho primogénito da mente de Sam Dunn e Scot McFadyen, é o documentário por excelência sobre a história e impacto social do Heavy Metal. Tecnicamente um trabalho bem executado no que toca a edição e encadeamento do argumento, o filme ultrapassa a barreira do exigido para qualquer documentário e entra num campo que está reservado apenas para aquelas obras que são movidas pela necessidade e pela paixão.

Sendo Sam Dunn licenciado em antropologia, a premissa colocada no documentário é simples e directa. O objectivo é descobrir as razões pelas quais o Heavy Metal provoca reacções tão dispares entre os elementos de uma sociedade. Por um lado, os fãs geralmente possuem uma paixão que ultrapassa a musica e se entranha no próprio modo de viver, de agir e pensar. por outro, estereotipado como “musica pouco sofisticada para pessoas pouco sofisticadas”, descartado como lixo auditivo, e a subcultura associada ao estilo vista como uma doença social.

Para resolver a questão imposta, os realizadores sabiamente decidiram iniciar as suas actividades com um dilema que divide a comunidade de Headbangers até aos dias correntes: Qual é a primeira banda de Heavy Metal. O encadeamento de ideias que se segue é de uma linearidade absurda, mas eficaz. Procurando as raízes, percorrendo os eventos marcantes, as bandas mais relevantes, os movimentos que foram surgindo dentro do Metal levam-nos inevitavelmente a um esboço muito pormenorizado do que poderá ser a resposta para a pergunta levantada.

Não pretendemos analisar pormenorizadamente o filme nestas linhas, pois isso seria mastigar a informação dada, coisa que deve ser feita individualmente sem opiniões externas. No entanto há pontos que são obrigatoriamente necessários destacar e posteriormente dissecar.

Quando falamos do Heavy Metal já não falamos de um estilo de musica apenas. Referimo-nos a uma panóplia de sonoridade diferentes, que vão do Glam Metal até ao Black Metal Norueguês. A composição, vocais, temáticas líricas, instrumentais e mesmo apresentação visual vai desde uns Black Sabbath a Carcass. Dunn chega a avisar que estas subdivisões se tornam confusas mesmo para o mais aguerrido Metaleiro, e tem razão. Tantas divisões parecem absurdas, mas não estamos a ouvir realmente o mesmo estilo se colocarmos um disco de Kreator, Thrash Metal alemão com letras trabalhadas sobre uma base de critica social, ou se estivermos a ouvir Cannibal Corpse, com o seu Death Metal visceral, que se debruça sobre cenários horripilantes.

No entanto, e independentemente das catalogações impostas pelas companhias discográficas para diferenciar produtos, assistimos novamente, como já havíamos feito nos posts anteriores, a um grupo de pessoas que se unem sob o estandarte unico, neste caso metálico e que assumem como modo de vida a musica que ouvem (ou será que o modo de vida que levam se reflecte na musica que fazem?). Mas ao contrario do punk que teve uma duração contada no tempo, e cujo revivalismo pouco ou nada tem haver, ideologicamente ao que era inicialmente (já que necessita do contexto social da época) e do hardcore, que possui uma cena mais pequena, o Metal, nas suas diversas vertentes, tem uma base sólida e gigantesca de seguidores que se espalham pelo mundo fora.

Podemos apontar com segurança duas razões para isso. Por um lado o Glam Metal, que baseava a sua imagem e letras na sexualidade, resultando por isso num óptimo produto de exploração para as industrias discográfica, foi o grande sucesso das massas americanas durante o final dos anos 70 inícios dos anos 80, e abriu as portas para a descoberta de sonoridades mais agressivas (tendo sido em parte responsável pelo surgimento do metal mais extremo, não por ter de forma alguma influenciado o estilo ou a composição, mas sim porque a juventude mais agressiva se opunha directamente a essas bandas de “pop” Metal cujo o conceito era leviano). Por outro, e este é o ponto fulcral, porque serve como resposta para a ansiedade adolescente, oferece uma resposta diferente a uma sociedade decadente.

A adolescência caracteriza-se muito pela procura de respostas, do nosso lugar no seio de uma sociedade desumanizada pela necessária sobrevivência capital. O punk e o Hardcore eclodem em alturas temporais em que a juventude encontrava uma situação social com a qual não simpatizavam, em que as condições oferecidas não correspondiam ao que era ansiado. O Metal, nascido musicalmente do Rock, do Blues, com o passar do tempo vai buscar também elementos ao hardcore e ao punk, estilos que inicialmente se opunham quase por uma questão territorial, e que a luz dos dias de hoje, se mergem, e se inspiram. Dai o seu sucesso e sobrevivência com o passar dos tempos. Adapta-se aos dias que emergem no amanha.

As temáticas do oculto, hedonismo, da medicina forense, da morte e critica social, que são apresentadas ao longo da historia do metal, e que por vezes são de um gore explicito (leia-se Cannibal Corpse), não são mais do que um reflexo, uma exorcização daquilo que tememos, daquilo que não compreendemos mas que nos atrai pelo seu mistério. E numa sociedade onde raramente podemos libertar assumidamente aquilo que tememos e encarar frente a frente as questões que nos ocorrem á noite debaixo dos lençóis, o Metal serve para um grupo de pessoas, que pela sua experiência de vida o encaram como um escape, como uma salvação. Citando Rob Zombie, no documentário em questão, não se trata de “musica casual”. E compreende-se que, tratando de assuntos tão viscerais, e com manifestações técnicas de puro virtuosismo, os amantes deste estilo o sintam assim tão perto do coração.

O filme de Sam Dunn fala-nos disto. Desmistifica o estereotipo de musica descartável, e revela um pequeno mundo movido pela paixão de quem sente o Metal na pele, e de quem se dedica de alma e demasiadas vezes de corpo a este estilo de musica. Não é para todos, não por ser elitista, mas se realmente se não sentimos os pelos da nuca arrepiar ouvindo o interlúdio da Master Of Puppets no final do documentário, se não esboçamos um sorriso olhando para a figura quase paternal de Dio quando fala, se não sentimos um orgulho vendo a multidão de corpos no Waken e uma gargalhada quando vemos o dia seguinte, então provavelmente este não é o estilo de musica que serve de banda sonora para a nossa vida, e não há mal nenhum nisso. Porque parte da mística desta musica é essa. Terminamos de escrever este post e sentimos vontade de ouvir a musica "Love us or Hate us" fazendo dela a trilha sonora para este momento em que terminamos a análize deste filme sendo essa musica a conclusão do post.

terça-feira, 12 de maio de 2009

American Hardcore: O ínicio e ebulição de um submundo em crescimento.


Este documentário escrito por Steven Blush é baseado no livro American Hardcore: A Tribal History escrito pelo mesmo, e pretende documentar as raízes e a primeira vaga de uma sub cultura que ainda hoje resiste.


O hardcore surge um pouco por toda a América em finais dos anos 70, e como todas as sub culturas nasce no seio de uma juventude descontente com a sua realidade e as opções que se lhes apresentam. Por essa altura os americanos lidavam com uma economia em decadência, desemprego, inflação, e as consequências da subida de Ronald Reagan á casa branca e o consequente medo e especulação de perda de direitos individuais e de liberdade de expressão.


Ideologicamente pode dizer-se que o descontentamento e rebelião contra qualquer tipo de instituição e autoridade se assemelhava ao movimento punk, a grande diferença reside no afastamento do niilismo auto destrutivo que o punk representava pela altura. Eram os finais da década de 70 e a maior parte dos jovens americanos entravam em negação dos seus próprios problemas, reinava um pensamento purista, a sempre e nunca cessante conquista do sonho americano. Era a explosão da new wave, do disco, sem conteúdo, repulsivo para alguns jovens que nele viam nenhum tipo de conteúdo e nada mais que mentiras e falsos sonhos numa sociedade em decadência e ao mesmo tempo em negação da sua realidade.


Musicalmente as raízes do hardcore são o punk e oi! Britânico, tal como o punk não prima pelo virtuosismo ou grandes capacidades musicais, e nem era essa a intenção, era uma expressão pura de raiva e descarga de energias e frustrações. A grande diferença do punk para o hardcore é que este era mais rápido, mais agressivo, e um pouco mais sóbrio.


Este movimento era feito por miúdos, adolescentes e jovens, era feito por eles e para eles, nasce aqui o DIY (do it yourself), em que as bandas gravavam as suas próprias demos, cortavam as suas próprias embalagens e organizavam-se entre si para programar concertos, tocavam em garagens, bares, casas, fosse onde fosse. Ninguém tinha a ilusão de vender álbuns, de fazer dinheiro, de passar na rádio, nem era esse o objectivo, o objectivo sempre foi manter o movimento pelo underground e é assim que se quer. Faziam-no porque gostavam, pela diversão para se expressarem e descarregarem raiva.


Nesta altura surge com os Minor Threath o conceito straight edge, que consiste basicamente numa juventude livre de qualquer tipo de drogas e de mente limpa a toda a hora. Isto explica-se talvez pelo facto de pela altura, precisamente por causa da new wave e do disco, ser crescente o número de jovens envolvidos muito cedo em drogas pesadas e destruírem assim a sua vida mal a começam.


Sendo o hardcore acessível a pouca gente pelas suas características invulgares e intoleráveis para a sociedade, este mantém-se no underground e cria-se entre os seus ouvintes um conceito de união, de uma família, uma tribo urbana. E haviam miúdos de todas as classes sociais, nem sempre se tratava de miúdos vindos de situações difíceis, era um estado de mente, de descontentamento, de inconformismo.


Nos anos 80 não haviam manifestações assumidas, nem organizações de qualquer tipo de esquerda nos EUA, havia o hardcore, uma cuspidela na cara do conservadorismo e sonho americano republicano.

Estes jovens não tinham qualquer ilusão de grandeza, de realmente conseguir mudar algo, e não seria esse o objectivo, não se procurava a revolução, era um mundo á parte, que mais ninguém entendia e assim estava perfeito. Algo que vem da alma, longe de ser uma moda ou tendência.


Bandas como os Bad Brains, um dos pioneiros do movimento, defendiam uma atitude positiva em relação á vida e ás adversidades. Uma forma de fugir ao negativismo da pressão da sociedade, sem se alienar, mas viver a vida de forma positiva da melhor forma possível. “I don’t care what you may say, we got that attitude, I don’t care what you may think, we got that attitude, we got that PMA (positive mental attitude)”


Esta foi a primeira vaga de hardcore, que termina por volta de 1985, apenas para começar outra a seguir, em Nova York principalmente, com o lançamento de The Age of Quarrel em 1986, dos Cro-Mags, que o filme não documenta, e para o espectador menos informado pode dar a ideia que aqui foi o fim do hardcore. Foi o fim de uma primeira vaga e sentimento que nunca se irá repetir, mas apenas para dar início a muitas outras. O hardcore, como um movimento pequeno e fechado que foi, influenciou, apesar de tudo, muitos estilos de música, também ela pesada, mas mais mainstream, nas décadas que se seguiram.


Hoje em dia este movimento espalhou-se por todo o mundo, os tempos são diferentes, a música evoluiu, misturou-se com outras influências, mas continua com o mesmo propósito, diversão, expressão, libertação de energias, amizade união e perseverança. Isto para alguns, porque nesta era de informação e desinformação há sempre quem siga o sabor da corrente.

sexta-feira, 1 de maio de 2009

The filth and the fury. Um tiro certeiro numa Inglaterra conservadora


Não pretendemos aqui apontar as qualidades técnicas, que de resto abundam, na montagem deste documentário. Interessa-nos dissecar ao osso e chegar a uma conclusão sobre as causas que levaram ao nascimento e o seu impacto social em Inglaterra do movimento Punk.

Para tal efeito, o melhor será beber da fonte, e ouvir da boca dos próprios Sex Pistols, banda que se não lhe deu origem, certamente liderou as massas juvenis no seio desse movimento. Discussões à parte sobre a origem da banda no que concerne ao comercialismo barato de Malcom McLaren, a realidade é que Johnny Rotten, vocalista e principal interlocutor do documentário em questão, nos dá a entender que no meio duma geração que parece perdida e sem rumo, esconde-se, não um pensamento per se, mas uma maneira de encarar a realidade social de uma forma peculiar e jamais gratuita, como muitos afirmam.

As primeiras imagens de" The Filth and The Fury" revelam-nos uma Inglaterra descontente perante as falsas promessas do Partido Conservador. Questões que se arrastavam desde o pós-guerra haviam atingido proporções desumanas, sendo que a classe operária, o tecido base de qualquer sociedade moderna, se corroía graças a posição económica que haviam sido forçados a aceitar.

As condições precárias de trabalho bem como os salários minúsculos que eram atribuídos, geraram uma panóplia diversa de problemas, podendo-se destacar o aumento significativo de confrontos e preconceito racial, constantes desacatos com as forças da autoridade, que para uma classe oprimida representam as ferramentas de repressão do estado, até a uma degradação na qualidade de informação mediática que mantinha convenientemente a população num estado de ignorância sobre os assuntos do pais e sobre as propostas governamentais para solucionar os mesmos. Quando Rotten diz que o povo estava assustado tem razões para o afirmar.

Para terminar este panorama social é necessário referir uma greve gigantesca por parte dos lixeiros municipais, que pararam de trabalhar quase 3 anos exigindo melhores condições de trabalho e um salário justo. A consequência desta greve é que a capital Inglesa fica submersa em lixo. O panorama visual não era agradável, e certamente não seria propicio a uma mente saudável.

Não obstante, uma grande parte da população juvenil preferia, segundo Johnny Rotten, esconder-se nas memorias de um passado mais agradável e que certamente não era seu, vestindo roupas que se enquadravam mais num contexto do movimento “flower power” do que propriamente na selva de cimento cinzento colorida por sacos negros imundos que se extendiam na cidade . No meio deste paradoxo visual, é natural que nasça algo como os Sex Pistols. É racional conceber que a revolta inconformista juvenil desse origem ao que apelidamos de Punk.

A musica é agressiva, reduzida á sua simplicidade de construção, mas é mesmo esse o seu propósito. Musica honesta, feita por quem se sente enganado, musica que recusa o pretenciosismo técnico e cujo o objectivo não é a exploração virtuosa nem a composição sem falhas. O seu âmago é expressão crua.

E dentro destes parâmetros o que se seguiu no que concerne ao visual e á atitude atribuída ao movimento punk, é duma simplicidade atrós. Não há dinheiro remendo as minhas calças com um alfinete de ama. O líder dos Sex Pistols afirma mesmo que a individualidade era o que contava. A utilização dos meios possíveis para se poder sobressair numa multidão, e deixar de ser mais um cidadão anónimo sem voz perante a situação vivida.

Não se trata de uma revolta assumida contra qualquer força governamental, mas sim um desligar consciente duma sociedade que se ignorava dentro de si mesma e no meio da crise se afundava no próprio desespero. A raiz do Punk não reside em mohawks, correntes e piercings de ama trespassando o nariz. Nasce com o objectivo de não representar mais do que a simplicidade de ser. Livre e individual. Claro que há um certo carácter romântico atribuído quando se coloca as premissas desta forma, mas é completamente plausível que no meio do caos social, a juventude londrina recuse essa mesma sociedade.

As consequências dessa movimentação juvenil no seu meio são claras. O individualismo e as ideias anti-sistema sobressaem no meio da conformidade geral, e a medida que o Punk ganhou adeptos e força, a comunicação social adquiriu um especial interesse nesta movimentação. Como consequência, o governo vê-se forçado a olhar para as suas medidas dum prisma diferente, de forma a prevenir que os jovens seguissem nessa direcção. Não queremos com isto afirmar que o movimento Punk tenha conseguido por si só corrigir a situação politica, mas quanto mais não seja, tornou visível aquilo que outrora escapava ao olhar resignado.

A mediatização do movimento, acabou por, inevitavelmente ser a sua morte. Com o aumento de cobertura mediática, as editoras acabaram por tomar interesse nesse novo estilo, o Punk Rock, e consequentemente começaram a surgir bandas novas por pessoas que não partilhavam os mesmos ideais(ou a falta deles) que caracterizaram inicialmente o movimento, e as próprias fileiras engrossaram com as populares cristas multicolor. A individualidade transformada em uniforme, o Anti-Sistema agora absorvido por aquilo que pretendia se desprender.

Prefácio

Bem-vindos a este nosso espaço virtual onde pretendemos analisar de uma forma crítica, diferentes manifestações de Contra culturas que se desenvolvem no espaço da urbe. É nosso intuito debruçarmo-nos sobretudo nas características psicológicas inerentes aos ditos movimentos, que por sua vez têm como veículo máximo de expressão, a Música.

Desta forma, abordaremos três sub Culturas diferentes, o Punk, o Hardcore e o Metal, sendo que a última análise se debruçará pela interacção entre as três, e a sua consequência na música contemporânea e na sociedade actual.
Basearemos a nossa análise principalmente em três documentários: The Filth And The Furry, American Hardcore e Metal: A Headbangers Journey, sendo nosso propósito completar a informação com uma análise detalhada sobre o assunto em questão.

Dito isto, NÃO PERCAM O PRÓXIMO POST, PORQUE NÓS TAMBÉM NÃO!!!!!!!